VIVENCIAL

Viver o cotidiano não exime da tarefa de pensá-lo, como não o faz a prática de experienciar a cultura em suas formas mais acabadas, inclusive naquilo em que nelas se imiscui a chamada vida comum. A proposta deste blog é constituir um espaço de intersecção entre esses campos vivenciais para pessoas que, como nós, têm na reflexão crítica um imperativo para a existência digna do corpo e do espírito – individual e social.

sábado, 8 de junho de 2013

Luta Terena: pela Terra, pela Humanidade



Participei ontem das manifestações em prol da luta dos índios Terena, outros povos indígenas e movimentos sociais diversos (com destaque para o MST e o Coletivo Terra Vermelha, aos quais se somaram a CUT, os trabalhadores da construção civil em greve e outros) pela demarcação das terras indígenas e pela justiça no campo. Mas ao invés de escrever uma crônica sentimental e talvez banal desse evento histórico (ainda que o Jornal Nacional não o tenha noticiado, apesar de ter mostrado a marcha dos fazendeiros no mesmo dia), acho mais interessante publicar aqui o Manifesto redigido pelo Movimento Acadêmico da UEMS-CG sobre a questão. Tomo a liberdade de ilustrar o texto com fotos da referida manifestação, tiradas pelo colega e amigo Volmir Cardoso Pereira.
 
Campo Grande, 06 de Junho de 2013.

O Movimento Acadêmico da UEMS - Unidade Universitária de Campo Grande -por meio deste documento expressa seu apoio à luta dos indígenas pela demarcação de terras e pelo respeito aos seus direitos fundamentais. Nosso apoio se estende, também, às lutas dos povos da terra, e não se restringe ao estado do Mato Grosso do Sul; mas abarcam todas as lutas das minorias oprimidas pelo poder.

A expropriação e aculturação de nossos companheiros indígenas é fato tão remoto quanto suas consequências. Submetidos à lógica do sistema capitalista e às suas contradições e injustiças, hoje, compõem nossa sociedade seviciados e obrigados a desempenhar nessa mesma sociedade, o papel de cidadão, imposto pelos modos de produção de vida das divisões de classes.

Privados de seus valores e de sua cultura, e esforçando-se para manter minimamente sua estrutura coletiva e material, são mais uma vez, vítimas de uma dominação colonial, tão passadista na história, entretanto pulsante na práxis cotidiana. Não bastando a pseudo ideia de inclusão que as instituições imprimem na sociedade, com uma plasticidade repleta de compreensão e compaixão, o indígena está muito distante dessa pseudo inclusão. Não obstante, essa mesma "inclusão" é um expediente paliativo para anular a reflexão do que deveria ser reconhecimento, e não simplesmente uma atitude de inclusão.

Se é verdade que contemporaneamente a preocupação com nossos companheiros é legítima, e que para tanto, as instituições sociais desenvolvem políticas voltadas ao seu bem estar e que são tratadas por órgãos competentes; então, qual seria a causa de tanto descaso das nossas instituições jurídicas e governamentais no que tange a causa indígena? Se, nossos companheiros indígenas estão continuamente sendo "incluídos" ao sistema político e social vigente, por que, nessa altura do desenvolvimento ainda continuam sendo expropriados de seu bem fundamental que é a terra?

A luta é de classes, e os estratos sociais mais abastados se dão o direito de lutarem pela perpetuação da desigualdade, sem a menor reflexão. Lutam pela acumulação de seu capital sob o signo do progresso e do esforço. Lutam pelas suas terras. Mas, que terras? As terras que garantiram pela usurpação?

Não causa espanto que esse segmento social que detém o poder maior, o capital, aja ignominiosamente. Afinal, é o capital que institui direitos... Para não esquecermos o que Marx já anunciava: "O Estado é o balcão de negócios da burguesia". É esse segmento social, por meio de seu poder monetário, que convenciona as regras para a sociedade. As classes menos favorecidas, põem em andamento essas convenções tendenciosas, e crêem na ideologia do "patrão". Todavia, não se pode perder de vista a manipulação ideológica que encarcera as reflexões. É muito conveniente não refletir, e adotar a perspectiva do "vencedor", daquele que chegou à prosperidade por seus méritos. Porém, esse vencedor é o integrante social "bem-relacionado"; suas necessidades sociais são forjadas para seus propósitos, e passam a ser modelos para os outros estratos sociais, o que garante a conveniência e a barbárie universais.

Nós, estudantes da UEMS de Campo Grande e integrantes do Movimento Acadêmico, hoje mais
capacitados a compreender esse mecanismo de dominação e de alijamento das classes menos favorecidas, consideramos lamentável a opressão e o descuido social de nossos representantes governamentais. Lamentamos, também, a ignorância e o conformismo social dessa sociedade alienada pelo capital, que adere às ideologias do poder; o mesmo poder que escraviza e oprime cada um de nós.

Aos nossos companheiros indígenas, povos da terra, declaramos nosso apoio, não apenas sob o signo da inclusão; mas visceralmente, sob o signo do reconhecimento da luta de cada um de nossos colegas indígenas, que compartilham em nossa comunidade acadêmica a busca pelo conhecimento e desenvolvimento crítico dos mecanismos que regem nossa história como sujeitos políticos, sociais e materiais, e acima de tudo humanos.

Não há dúvidas de que a falta da terra é a causa que recorre nos problemas que influem nas comunidades indígenas. As dificuldades decorrentes dessa falta são conhecidas de nossos companheiros de maneira substancial; elas são inerentes do processo de inclusão que urge de forma peremptória, característica do sistema do capital.

É por reconhecer a importância da terra para nossos companheiros, e sobretudo por reconhecer neles, e também, em suas ações, a autoria de um trajeto histórico de lutas, opressões e preconceitos; que apoiamos, as demarcações das terras indígenas, assim como apoiamos as reformas agrárias ligadas aos povos da terra.

Não é possível conformar-se aos desmandos de um sistema que flutua ao sabor de resoluções do agronegócio, o qual reivindica a posse de terras alheias, alegando a insígnia do progresso e do desenvolvimento. Não é possível conformar-se com a violência da investidura governamental contra a reivindicação dos povos da terra. Não é possível aceitar justificativas pelo olhar do sujeito dominador que fere um direito fundamental: a vida.

Aos companheiros indígenas da UEMS de Campo Grande, parceiros de lutas estudantis, tão engajados e solidários com a causa coletiva, deixamos aqui nosso apoio e respeito. Compartilhamos de sua indignação. Lamentamos suas perdas; e nos envergonhamos do descaso e da alienação de nossa sociedade sectária.

Movimento Acadêmico da UEMS – UUCG.

Faixa com grafite do artista plástico Luciano Alonso

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