VIVENCIAL

Viver o cotidiano não exime da tarefa de pensá-lo, como não o faz a prática de experienciar a cultura em suas formas mais acabadas, inclusive naquilo em que nelas se imiscui a chamada vida comum. A proposta deste blog é constituir um espaço de intersecção entre esses campos vivenciais para pessoas que, como nós, têm na reflexão crítica um imperativo para a existência digna do corpo e do espírito – individual e social.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A morte de Kadafi e outros "gestos naturais"

Não vou ilustrar este post, porque, apesar de tudo, este não é um arquivo do horror. Se for, que pelo menos não seja um álbum de figuras disso. Também não vou me desculpar, novamente, por me valer de uma canção, dessa vez, aliás, de Caetano Veloso, com quem não simpatizo muito. É que isso tudo está além das simpatias particulares.

Quem quer, aliás, que tenha compartilhado, com maior ou menor ingenuidade, da utopia das "relações Sul-Sul" ou dos "países não alinhados", ou tem ou já teve aspirações socialistas, dificilmente não simpatizou, em algum momento, com Muamar Kadafi. Mas não é isso, mesmo porque essa simpatia já deixou de existir há muito tempo (o que não me impede de reivindicar, com lucidez, a necessidade de se reconhecer as conquistas do regime de Kadafi na Líbia), que me leva a escrever esta nota.

Aliás, nem tenho muito o que escrever. O que me move é, por assim dizer, apenas o acúmulo das atrocidades. Não escrevi sobre o assassinato de Bin Laden porque tudo foi muito grotesco para ser alvo de uma análise crítica, mas quando o grotesco se soma ao grotesco e a tendência é que continue assim, deve haver alguma coisa errada com nossos juízos críticos.

Há muito não admiro mais Kadafi, e também não tenho intenção de julgar se o que houve foi um fato inteiramente predeterminado ou não, e por mando ou obra de quem. A vida de Kadafi não vale mais do que a de qualquer outro, aliado ou inimigo seu, dentre as milhares que já se perderam em mais esse conflito sangrento. O que me assusta é a cultura de Cruzada ("racional", claro, e "humanista" - econômica? quem sabe?) a que essas imagens (e uma sigla como "Otan", legitimamente usada ou não) alimentam e, antes disso, confirmam.

O que me assusta é a sanha, a sanha de matar. É essa a Justiça que aguardam os líbios? E não só os líbios, aliás?

O que houve em uma cidade interiorana dos Estados Unidos, se não me engano no mesmo dia da morte de Kadafi, foi um fato de outra ordem de gravidade, mas também grave, e muito. A caçada e o abate selvagem de animais, muitos, suponho, protegidos por  lei, "ocasionada por" (reparem nas aspas, porque, de novo com Caetano, tudo é muito mais) um gesto estúpido de um suicida dono de um zoológico (que soltou os animais antes de se matar), deveria, no mínimo, levar a pensar se vidas, não humanas (se isso faz tanta diferença), mas capazes de interferir diretamente em vidas humanas, podem mesmo ser objeto de exploração para lucros de particulares.

Aliás (acrescento isso agora, dia 22), se vidas o podem.

E, no entanto, a provável guinada à direita da Líbia, senão sua inteira submissão ao "capitalismo multinacional" (os poços de petróleo, lembram?, mas quem sou eu para cogitar sobre isso), faz pensar que é esse, ainda, o rumo que segue esse barco sem rumo: a sanha desumana do capital.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Adeus Ibama, adeus Cerrado

Este é um post de caráter emergencial; pena que se trata de uma causa provavelmente perdida. Quem dera este blog tivesse prestígio suficiente para intervir num absurdo desses; na falta disso, que fique registrada pelo menos a indignação - minha, de meu colega Daniel Blamires, o grande Danbla, e de seu colega Dhego, por via dos quais me chegou a notícia e a nota indignada (de autoria do Dhego, salvo engano) que reproduzo abaixo.

Primeiro a nota, com pequenas modificações e acréscimos que apenas referendam minha concordância com seu teor:

Isso não poderia acontecer. Agora é que a fauna e flora do Cerrado vão tudo ao chão! Mesmo alegando que o Ibama já não exerce tanta função na sociedade, talvez neste momento a ação mais importante seja a fiscalização para proteger a biodiversidade que ainda nos resta em Goiás. O nome IBAMA é muito forte, e mesmo sem atuar impõe medo e respeito, e fechando esses escritórios, principalmente o de Iporá-GO, que está próximo às bacias do Caiapó, Rio Claro e Araguaia, pescadores, caçadores ilegais e traficantes vão andar à solta por aí, mais uma vez eles venceram, e devem estar comemorando agora.
Cadê as autoridades, municipais, estaduais, vereadores, deputados etc? Façam alguma coisa agora. Ou não, por quê, será por quê???
Fechar postos estratégicos do Ibama significa um perda muito grande, um muro que desaba, a fragilidade tomará conta do Cerrado. Quem irá pagar por isso??? A próxima geração??? Não! isso não!! Não está de acordo com o artigo 225 da Constituição.
Acredito eu que o certo era aumentar os efetivos dos escritórios, que estão lotados de denúncias, e não fechá-los. Será que alguém vai sair do ar-condicionado em Goiânia ou Brasília para vir atender uma denúncia de pesca ou caça ilegal aqui no Cerrado?? E se for uma emergência ambiental??? Fala sério!!! Isso nos deixa indignados.
Meus sentimentos! Cerrado... Infelizmente, o sistema assim!!!! Adeus.


A notícia:

Ibama fechará cinco escritórios regionais no Estado de Goiás

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) passará por uma reformulação e fechará cinco unidades em Goiás. Uma delas é a de Rio Verde, a 220 km de Goiânia, que atuava na região sudoeste do Estado há 41 anos. Também serão desativados os escritórios regionais que funcionavam em Catalão e Uruaçu, bem como as bases avançadas de Ceres e Iporá.
Restarão apenas as sedes de Goiânia e São Miguel do Araguaia , a 490 km da capital. A medida faz parte de uma reestruturação nacional que está sendo feita na autarquia.
O doutor em meio ambiente Bruno Botelho Salé discorda do fechamento do escritório de Rio Verde. “Com o fechamento desse escritório regional, o Ibama passa a ficar fora do contexto dos problemas ambientais de Rio Verde e região. É no mínimo um retrocesso”, argumenta.
A Superintendência do Ibama informou que as mudanças estão sendo feitas porque o Instituto já não exerce mais um atendimento direto à população. Como é o caso dos licenciamentos ambientais, que são de responsabilidade das secretarias municipais de meio ambiente. Com a reformulação, a preocupação maior passa a ser com as fiscalizações.
“Só com o escritório em Goiânia dificulta o acesso do pessoal vir aqui fazer a parte da fiscalização”, afirma Bruno Salé.
Só o Ibama do sudoeste goiano, com sede em Rio Verde, atendia 30 municípios. Todos os anos eram registrados centenas de crimes ambientais como pesca predatória, desmatamento ilegal e apreensão de pássaros silvestres. Todo esse monitoramento passará a ser feito pela Secretaria Municipal de Agricultura e Meio Ambiente de Rio Verde, que atualmente conta com nove fiscais. 
Segundo a titular da pasta Marion Kompier, com o fechamento do escritório, os fiscais da secretaria ficarão sobrecarregados. “Em nível ambiental, o município perde”, diz. 

Fonte: Jornal Bom Dia Goiás, 17 de outubro de 2011.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Joãzinho chega à Universidade

João Calvino tentando entender o
tema da redação do Enem 2010
Pra não dizerem que eu não cumpro minhas promessas (vejam este post já antigo)...

Depois de três vestibulares, Joãozinho finalmente consegue passar pra Letras na UNCAFUNJU (Universidade dos Cafundós dos Judas, privada, é claro). No primeiro dia de aula, a professora, digo, o professor explica aos alunos a diferença entre prosa e verso. 

— Verso, diz ele, é quando existe uma rima. Por exemplo: "Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá... As aves que aqui gorjeiam, não gorjeiam como lá". Viram? "Sabiá" rimou com "lá"! 

— Ahhhhhhh..., exclamam os alunos, mostrando que entenderam.

— Prosa é quando não há rima. Por exemplo: "É preciso ter confiança na capacidade que cada pessoa tem de ensinar a si mesma". Assimilaram?

— Assimilamos!!!

O professor pega a chamada e vai direto pro fim da lista:

— Zequinha, me dê um exemplo de verso!

— "Pela estrada afora eu vou bem sozinha, levar esses doces para a vovozinha."

— Muito bem, diz o professor, orgulhoso. "Sozinha" rimou com "vovozinha". Vê-se bem que você não está aqui por acaso. Agora o Juquinha. Me dê um exemplo de prosa. 

— "O trabalho dignifica o homem."

— Muito bem, Juquinha. Sem rima é prosa. Parabéns! Isso mostra por que você foi tão bem no Enem. Ops, rimei!

Percebendo que Joãozinho (já famoso) estava "alugando" uma colega lá no fundo, o professor o chama com rispidez:

— Joãozinho!

O moleque, digo, rapaz, se levanta, desafiando:

— Pois não, 'fessor! Quer em prosa ou em verso?

— Em verso!

— Lá vem o canguru, com uma linda flor no c...

— Pode parar, Joãozinho!!! Essa rima vulgar eu não aceito!

E o Joãozinho, num átimo de segundo:

— Lá vem o canguru com uma flor na bochecha, que no cu o professor não deixa!

Este post é dedicado ao Omar Rodovalho, um cara legal praca...

Joãozinho quando ainda sonhava em fazer Artes

Bonus track: